Robôs e drones chegam ao campo

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Pesquisadores aprimoram tecnologias usadas nas áreas espacial e militar para a produção agrícola

A tecnologia já invadiu o campo faz tempo. Foi com automação de maquinário e biotecnologia que a produção de grãos no País cresceu cerca de 60% nos últimos dez anos. A expectativa, no entanto, é de que avance mais 40% até 2020 – o dobro da meta mundial. Na corrida para aumentar a produtividade, centros de pesquisa e grandes grupos do agronegócio já experimentam tecnologias das áreas espacial e militar. Robôs na terra, drones no céu: eis o próximo passo do campo brasileiro.

“Ele poderá medir a quantidade de matéria orgânica do solo, sua umidade e fertilidade, bem como fazer análise nutricional das plantas e até detectar doenças”, explica a professora Débora Milori, pesquisadora do laboratório de óptica e lasers da Embrapa.

Em setembro, um pequeno protótipo foi montado e testado em laboratório. “Agora, estamos construindo um robô um pouco maior, robusto o suficiente para ir a campo em terreno acidentado”, explica Débora. O aparelho terá cerca de 1,5 metro de comprimento, 1 de largura e 0,8 de altura. A primeira versão será apresentada em novembro, numa feira do setor.

Segundo ela, o robô será de grande valia aos agricultores por permitir um mapeamento preciso da lavoura, já que hoje a aplicação de insumos é determinada pela média das amostras, numa análise de solo muito espaçada. “A otimização de insumos terá impacto tanto financeiro como ambiental, reduzindo aplicações desnecessárias.”

A conclusão do projeto levará três anos. Para ela, ainda é cedo para afirmar quando a tecnologia chegará ao mercado, pois mesmo onde já há projetos similares, nos Estados Unidos e em alguns países europeus, eles ainda estão em fase de experimentação.

Scanner voador. Há alguns anos, o mundo descobriu a versatilidade dos drones ou vants – veículos aéreos não tripulados para fins militares. Eles são pequenos, leves e podem fazer imagens de resolução muito superior às de satélite. Não demorou muito para despertar a curiosidade dos produtores. Seu uso na agricultura ainda é incipiente, mas vem crescendo – hoje, mais de 200 drones sobrevoam as lavouras brasileiras.

“É preciso entender que um drone nada mais é do que um ‘tripé voador’”, afirma Rubens Coelho, pesquisador da Esalq-USP. “Seu aproveitamento depende do tipo de câmera que carrega e de como as imagens serão interpretadas.”

Os preços dos modelos variam de US$ 3 mil a US$ 100 mil; e as câmeras, de US$ 1 mil a US$ 200 mil. Drones maiores conseguem carregar câmeras mais sofisticadas, que podem até fazer um “raio X” da planta. ” As câmeras hoje têm sensores infravermelho, que permitem ver pragas e doenças precocemente. Mais que o olho do agricultor, pois o olho enxerga só o visível”, diz Lúcio Jorge, que coordena as pesquisas com drones na Embrapa.

Hoje pouco mais de 15 empresas produzem drones no País. O desafio, no entanto, não é no hardware, mas no software – é preciso aprimorar os programas que interpretam as imagens, para transformá-las em informações aplicáveis. É nessa área que centros de pesquisa como a Esalq-USP e a Embrapa têm se debruçado, uma vez que cada cultura tem uma necessidade específica.

A Embrapa, por exemplo, tem empresas parceiras com as quais desenvolve softwares customizados. “Com a Monsanto, temos focado na avaliação dos híbridos de milho; com a SLC, na influência de nitrogênio no desenvolvimento do algodão; com a Zilor, de cana-de-açúcar, no monitoramento de falha de plantio”, diz Jorge.

Para Coelho, serão necessários pelo menos cinco anos para que o uso de drones se popularize. Uma das barreiras à expansão é a falta de regulamentação. Em fevereiro, a Anac anunciou regras para uso civil dos vants, que entram em vigor até o fim do ano. Serão permitidos drones de até 25 quilos em lugares públicos a até de 120 metros de altitude.

“A popularização desses aparelhos vai depender mais do mercado do que da tecnologia”, afirma Sílvio Crestana, um dos fundadores da Embrapa Instrumentação. “Não há limitação tecnológica, há potencial, mas vai depender de viabilidade econômica e políticas públicas para baratear o custo.”

Pouco mais de um ano após adotar o uso de drones para monitorar suas florestas de eucalipto no Mato Grosso do Sul, a produtora de celulose Eldorado Brasil adquiriu na semana passada seu quarto veículo. Hoje, um quarto dos 160 mil hectares de área plantada do grupo já é sobrevoado pelos vants, que fazem fotos georreferenciadas da plantação para avaliar o desenvolvimento do plantio e mapear falhas e pragas.

“A visão do homem no solo é muito limitada para avaliar qualitativamente um plantio extenso como o florestal”, diz Carlos Justo, gerente de planejamento da Eldorado. Após recorrer a imagens de satélite e sobrevoos esporádicos de aviões, a empresa resolveu apostar nos drones pela prometida flexibilidade e precisão.

“A amplitude do satélite é boa, mas é pouco flexível para uma resposta rápida, pois eu preciso programar sua passagem e posso ser surpreendido por uma nuvem, por exemplo”, diz ele, explicando que o drone não enfrenta o mesmo problema por voar em altitudes mais baixas – de 100 a 300 metros. Justo destaca ainda a qualidade das fotografias produzidas. “Enquanto na imagem do satélite um pixel equivale de meio metro a cinco metros, no drone, representa de quatro a seis centímetros”, diz.

Apesar do alto custo, a companhia se mostra entusiasmada com o retorno do investimento. Para realizar o monitoramento de sobrevivência – avaliação das mudas de eucalipto três meses após o plantio, fase crucial para determinar as chances de a planta alcançar a maturidade –, o trabalho que levava de dois a três dias no campo passou a ser feito em oito horas com as três aeronaves.

“Antes, duplas de técnicos iam a campo contar as mudas e fazer a avaliação de sobrevivência. Hoje, esses mesmos técnico foram capacitados a operar o equipamento”, diz Justo. “Já saímos do escritório com o plano de voo programado. Daí é só acionar o vant para realizá-lo”, diz.

De acordo com a empresa, o custo do monitoramento de um hectare (mais ou menos 1,2 campo de futebol) baixou de R$ 6,68 para R$ 4,68 – uma redução de mais de 30%. Em 2013 foram realizados 1.048 voos com drones, num total de 411 horas.

O próximo desafio da Edorado é concluir um software próprio de análise, que está sendo desenvolvido em parceria com a Universidade Federal de Visçosa. O programa atual condensa as diversas tomadas feitas pelos drones em cada ponto de GPS em uma só. A contagem das mudas, no entanto – que se destacam na imagem frente a outras gramíneas pela tecnologia da câmera de infravermelho – é feita manualmente pelos técnicos. “O nosso software irá automatizar a contagem de plantas”, diz Justo.

Do papel para o tablet

Há quatro anos, o monitoramento da produção agrícola das fazendas do Grupo André Maggi (Amaggi) era feito manualmente. Ao visitar os 258 mil hectares de lavouras de soja, milho e algodão espalhadas em cinco cidades do Estado, os coordenados de campo registravam informações sobre produtividade, aplicação de defensivos, precipitação e performance das pragas, que demoravam cerca de cinco dias para chegarem ao escritório da sede e serem incorporados ao banco de dados.

Até que, em 2010, a empresa começou a buscar uma solução para fugir da pilha de formulários e otimizar o uso do software de gestão que vinha sendo desenvolvido desde 2006. A solução, óbvia e surpreendente ao mesmo tempo, veio num aparelho que era a sensação do momento, mas dificilmente seria associado ao campo: o tablet.

Após uma série de testes, o grupo adquiriu 100 tablets Samsung Galaxy Tab 2 e 3, de dez polegadas, e desenvolveu com uma empresa uma aplicação própria em Android que rodasse no aparelho, num investimento de mais de R$ 320 mil. Aos funcionários, foi dado um treinamento de cem horas para manusear o novo ‘formulário’. “A aplicação é muito simples e intuitiva, para que mesmo pessoas com grau baixo de escolaridade não tivessem dificuldade de navegar”, diz Ricardo Moreira, gerente de controle de produção do Amaggi.

Com os tablets em mãos, monitores, coordenadores de campo e engenheiros agrônomos passaram a receber e a repassar instruções para o dia e, a campo, fazem uso do GPS e registram – offline – as condições da lavoura. Ao fim do dia, as informações são “descarregadas” via Wi-Fi no escritório. Às sete da manhã do dia seguinte, é disparado um e-mail a todos os surpervisores com um relatório atualizado sobre a safra – indicadores de plantio/colheita, produtividade, custos, performance de máquina, entre outros.

“Ganhamos precisão na qualidade das informações. Antes, como a pessoa escrevia num formulário em papel e isso chegava cinco dias depois para ser registrado no sistema, se houvesse algum problema, isso demorava de sete a dez dias para retornar à lavoura. Hoje, o feedback já chega no dia seguinte”, diz Moreira. Segundo ele, a empresa deixou de utilizar 50 mil formulários por safra com a nova metodologia.

“Quem executa a operação e tem um poder de minimizar desperdícios são as pessoas lá na ponta, no campo. A nossa opção por tablet foi para devolver a elas informações inerentes ao dia a dia de suas atividades, como indicadores de performance, custos operacionais, rendimento das equipes e das máquinas.” Além do controle agrícola, os funcionários têm acesso aos mapas da fazenda, consultam documentos de apoio e fotografam pragas, por exemplo.

A empresa começou com 100 tablets, hoje tem 150 e não quer parar por aí. Para Moreira, além da otimização de tempo e recursos, outro grande benefício foi a inclusão digital dos funcionários, que agora acessam e-mails, assistem a vídeos. “Hoje, se você for na fazenda e pedir para tirar o tablet do funcionário, ele briga com você. É um caminho sem volta”, diz.

FONTE: ESTADÃO